Pesquisar

sábado, 15 de fevereiro de 2014

BANDA DE IPANEMA COMPLETA MEIO SÉCULO E  É
CONHECIDA COMO A MÃE  DE TODAS  AS BANDAS


Elemento preso por sucker and fucker




Texto e fotos de Luiz Carlos Lourenço


A Banda de Ipanema, que comemora 50 carnavais este ano, realizou neste sábado seu primeiro desfile em Ipanema, na Zona Sul do Rio. 
À frente dos músicos,, uma das faixas apresentava a inscrição “Banda de Ipanema, festa de todos - 50 anos de democracia nas ruas”. Assim é como gosta de ser conhecida a banda mais tradicional da Zona Sul e que deu origem à todas as outras no Rio de Janeiro e demais estados. Uma outra grande faixa, empunhada por duas mulatas, homenageava integrantes da banda recentemente falecidos, como o  advogado Alcyone Araujo,  a caricata Lola Batalhão(o ator e estilista Arthur Moura), a ex-vedete Virginia Lane e o carnavalesco e cenógrafo Fernando Pamplona.
— Somos uma banda. Com muita democracia e por isso temos no nosso desfile índio, branco, preto, gay, árabes, judeus, católicos e protestantes. Aqui pode vir quem quiser. Não temos abadá nem cordão de isolamento. Por isso é que reunimos multidões todos os anos — disse José Ruy Dutra, um dos oito fundadores vivos do banda. 
Além de milhares de turistas do exterior e de outros estados brasileiros, muitas personalidades do meio artístico estavam lá como o compositor Paulinho da Viola,  o ator e diretor de TV Wolf Maya, o ator Déo Garcez  as irreverentes Isabelita dos Patins e Katia Furacão e as cantoras e compositoras Tania Malheiros e Telma Tavares.
Paulinho  da Viola explicou sua presença no desfile comemorativo do cinquentenário da banda:



— Eu não sou um dos fundadores, mas no ano seguinte da criação da banda, já estava com amigos e músicos participando do desfile, que é marcado por irreverência, humor crítico e, sobretudo, carnaval.

Travestida de Carmem Miranda, Juju Maravilha, que há 15 anos sai na Banda de Ipanema foi uma das primeiras a chegar na concentração da praça General Osório:.
— Sou a pessoa mais parecida com Carmem Miranda no mundo. Isso quem disse foi a própria irmã dela-comentava orgulhoso o travesti.



50 ANOS GLORIOSOS



Segundo os organizadores, o desfile reuniu cerca de 5 mil pessoas, menos do que o esperado. De acordo com os organizadores, isso se deu por causa da previsão de chuva, que acabou nem caindo.


Maria Vasco, primeira porta-bandeira a desfilar na banda falou do seu orgulho em desfilar:
— É maravilhoso estar aqui, já que. esta banda representa a filosofia de Ipanema

A Banda de Ipanema, que foi fundada em 1964, é considerada a banda carnavalesca mais democrática da cidade e consegue arrastar pelas ruas de Ipanema pessoas de todas as idades e classes sociais, além das incontáveis drag-queens, que desfilam em harmonia em meio ao público hétero.

A Banda de Ipanema é a mãe de todas as bandas carnavalescas do país e sua origem já faz parte da história cultural da Cidade Maravilhosa. 

Conta-se que em 1959 o clima do bairro de Ipanema era de uma cidade de interior. Foi quando Ferdy Carneiro convidou alguns amigos para inaugurar um clube em Ubá (MG), durante o feriado de carnaval. 

A  banda de Ipanema agita

A turma de amigos, entre eles Albino Pinheiro, Paulo César Sarraceni e J. Rui, presenciou uma manifestação carnavalesca tradicional na cidade, realizada pela famosa Banda Philarmônica Embocadura, que pertencia à família de Ferdy.

Era uma banda em que os pseudo músicos saíam trajados de branco e com chapéu de palha, sendo que nenhum deles tocava instrumento algum. 

Atrás, vinha uma banda de verdade, que animava o carnaval de Ubá, terra de Ary Barroso. 

Quando Ferdy e seus amigos voltaram ao Rio, inspirados naquela animada festa que viram em Ubá, decidiram criar a sua própria banda.

Designer formado pela Escola Superior de Desenho Industrial, jornalista, programador visual, diretor de arte de agências de propaganda e artista plástico, Ferdy Carneiro, ex-diretor administrativo do Museu Carmem Miranda, falecido em 18 de outubro de 2002, era um mineiro apaixonado pelo Rio, boêmio “de carteirinha”, frequentador das rodas de samba mais tradicionais e apreciador de bebidas. 

A família Chaves de São Paulo


Ele trabalhou no teatro e cinema – sua grande paixão – e escreveu no Pasquim.

No carnaval de 1965, ano do 4.º Centenário da Cidade do Rio de Janeiro, tendo como referência aquela banda de Ubá e outras ideias na cabeça, Albino Pinheiro, animador cultural e considerado “o prefeito espiritual da cidade do Rio de Janeiro”, por sua animação e carioquice, o designer Ferdy Carneiro, o cartunista Jaguar, futuro criador do jornal Pasquim, e mais alguns amigos fundaram a Banda de Ipanema. 

Em um bar, Jaguar fez a lista com os nomes dos integrantes: trinta, ao todo.

Naquela época, primeiro carnaval após o golpe militar, quando era proibido juntar mais de 50 pessoas em local público, a Banda de Ipanema conseguiu reunir cerca de 10 mil foliões. 


Desde o primeiro desfile, a banda exibe uma faixa com um lema – “Yolhesman Crisbeles” – que sempre intrigou o pessoal do antigo SNI, que deduzia ter ela um significado que, embora obscuro, certamente era subversivo. 

A expressão enigmática, segundo um cordelista da Estação Pedro II da Central do Brasil, seria o grito do anjo exterminador no dia do Juízo Final.

Nascida da combinação de boêmios intelectuais com o espírito dos blocos carnavalescos dos subúrbios, a banda desfila 15 dias antes do carnaval, antecipando a folia carioca. Sempre teve padrinhos e madrinhas famosos. 


A este fato, reporta-se Sérgio Cabral, em um seu livro O ABC de Sérgio Cabral, publicado em 1977: “Ser padrinho ou madrinha da Banda de Ipanema é uma grande honra, como se vê pelos nomes escolhidos nesses 12 anos de existência: Clementina de Jesus, Nássara, Eneida de Morais, Bibi Ferreira, Lúcio Rangel, João de Barro, Leila Diniz, Aracy de Almeida, Clara Nunes, João Nogueira, Oscar Niemeyer, Grande Otelo, Martinho da Vila, Nélson Cavaquinho e Cartola”.

Em 1976, Albino Pinheiro convidou Beth Carvalho para madrinha. Como ela havia viajado para a Europa, Albino convocou Bibi Ferreira para o lugar. 

Beth Carvalho, entretanto, largou Paris e correu para pegar o desfile da banda, quando encontrou Bibi Ferreira em seu lugar. 

A cantora ficou tão chateada que recusou o convite para ser madrinha do desfile de 1977. “Só aceito em 1978”, disse ela, vingando-se da hesitação do comandante Albino Pinheiro.

Nessa época, a banda chegava a desfilar com mais de 20 mil foliões. 



Cabia às irmãs gêmeas Laura e Delia (então com mais de 80 anos) e, ainda, às irmãs Judith e Hilda boa parte da alegria no desfile. 

O percurso da banda é sempre o mesmo: Praça General Osório, Rua Teixeira de Melo (na contramão), avenida Vieira Souto, rua Joana Angélica, rua Visconde de Pirajá, e retorno à praça General Osório.

Logo na primeira saída da banda, os componentes perceberam a força e o carisma que tinha naquilo que restituía o carnaval de rua. Mas apenas uma banda em Ipanema não bastava. 

A faixa, que trazia escrito “Uma Banda em Cada Bairro”, carregada durante o primeiro desfile, tinha o objetivo de fazer com que mais pessoas aderissem à animada festa. E foi isso que aconteceu. 

Em pouco tempo, muitas bandas surgiram e várias pessoas deixaram de sair do Rio de Janeiro devido a propagação desta folia. 


Ferdy Carneiro e sua turma batizaram algumas destas bandas. A do Leme foi a primeira, depois a do Cardeal Arco-Verde e até bandas de outros estados. 

A Banda de Ipanema ressuscitou o carnaval de rua que parecia esquecido.

Conta-se que durante o Regime Militar, duas agentes do Serviço Nacional de Informação (SNI) infiltraram-se no desfile da banda disfarçadas de senhoras da terceira idade, querendo descobrir “códigos subversivos”. 


A resistência ao regime militar, porém, não se restringiu ao deboche. Nos anos de chumbo, Albino e Jaguar organizavam festas para arrecadar dinheiro para as famílias dos presos políticos e para o Partido Comunista. 





Entre os nomes que colaboraram estavam Carlos Drummond de Andrade, Paulo Mendes Campos, Oscar Niemeyer, João Saldanha e Ziraldo. 

Histórias curiosas envolvendo personalidades famosas proliferam na folclórica trajetória da Banda de Ipanema. Uma delas ocorreu no ano em que Tom Jobim foi padrinho do bloco. 

Alguém notou que o maestro desfilava com um tênis novo em folha e perguntou se ele o havia comprado especialmente para o carnaval. 

Ao que o maestro respondeu: “Pedi a Deus um tênis novo para desfilar. Bem, pelo menos, foi o que Ele entendeu”. 


A atriz Leila Diniz era (e até hoje) considerada a musa da banda, primeira e única. 

Tombar a banda é perseverar a memória. 

“Foi tombada, então não pode acabar. Se um dia os novos diretores da banda desistirem, o poder público tem obrigação de botar a banda na rua. Acabou de tombar, criou esse dever. Vai ser ótimo porque é uma instituição que deve ser preservada. Eu achei um achado o negócio de tombar um bem não-material. É uma ideia que tinha de nascer no Rio de Janeiro”, completa Ziraldo.



Albino Pinheiro, que morreu no dia 24 de junho de 1999, no Rio de Janeiro, aos 66 anos (dois anos antes havia sido diagnosticado que ele sofria de câncer na medula óssea), era mais conhecido fora de seu território como o fundador da Banda de Ipanema, que ressuscitou o carnaval carioca de rua e, desde 1965, gerou tantos filhotes pelo Brasil. 

Mas todas as tentativas que se fizeram para classificá-lo profissionalmente resultaram incompletas e injustas. Procurador do Estado? Pesquisador do carnaval? Produtor cultural? Boêmio histórico? Estudioso profundo das coisas do Rio? 

Ele foi cada uma dessas coisas e também a soma delas, mas mesmo esta era uma redução. A única categoria que o abrangia era a de carioca. Aliás, Albino não se contentaria com nenhuma outra. 

O Rio não era apenas a cidade onde ele nasceu e sempre viveu, mas um espaço humano e geográfico a que dedicou cada dia de sua vida.