Pesquisar

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

DO ALMANAQUE GAÚCHO, DA ZERO HORA DE HOJE, DIA 24/01
O DIA EM QUE CHARLES TRENET ACABOU NA DELEGACIA...




Charles Trenet: um superastro francês na delegacia de Porto Alegre

24 de janeiro de 2014 


Houve o dia em que um astro internacional da canção francesa acabou detido em modorrenta delegacia de Porto Alegre. Aconteceu em maio de 1953, e a estrela era o compositor e cantor Charles Trenet, espécie de Frank Sinatra francês de seu tempo, artista da mesma constelação de Charles Aznavour. Escritor, poeta e showman de sorriso fácil, Trenet ganhou fama com suas canções e posições polêmicas que manteve mesmo durante a invasão da França pelos nazistas. Foi perseguido, censurado e detido pela sua atividade, pela amizade com judeus e pela condição declaradamente homossexual.
Por essa época, a canção Douce France (Doce França/ Caro país da minha infância/ Embalado por suave imprudência/ Eu mantive você no meu coração!) transformou-se em símbolo de resistência. Diante de Hitler, era provocação.
Após a guerra, Trenet conheceu Cole Porter, Duke Ellington, George Gershwin, Louis Armstrong e Charles Chaplin e correu o mundo em turnês de superastro, inclusive no Brasil. Até o desembarque em Porto Alegre, em 21 de maio, três dias depois dos 40 anos.
Foi um sucesso os recitais no Theatro São Pedro e na boate Mil e Uma Noites, sempre lotados. Acompanhado por pianista francês, interpretou, entre outras, Douce France e a romanesca Que Reste-t-il de nos Amours.
Mas havia um show na matiné de domingo, a preços populares, agora no Cine Teatro Imperial, na Praça da Alfândega. Chovia na manhã do dia 24. Pouco antes das 10h, hora do show, Trenet espiou a plateia, viu apenas a metade dos lugares ocupados e não gostou. Não entraria no palco, não ele, um astro de Paris. Os espectadores reclamaram, vaiaram – e o pianista tocava algo para abafar a algaravia dos protestos. Trenet não faria a matiné, e a polícia foi chamada.

Então Trenet surpreendeu. Atirou-se no palco e exigiu uma ambulância aos gritos e acabou carregado pelos pés e mãos até a radiopatrulha. Na delegacia, alegou sofrer de uma antiga batida na terceira vértebra, o que não foi constatado por um médico. Depois de muita explicação diante do delegado, Trenet admitiu devolver um terço do cachê da terceira apresentação. Deixou Porto Alegre no dia seguinte. Jamais voltou. Morreu em 2001, aos 87 anos.



Colaborou Marcello Campos
Fotos do banco de imagens